12/10/2011

Você usa muleta?

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Durante a minha leitura do livro "Como um místico amarra os seus sapatos" uma, das várias histórias, me chamou a atenção:

"Foi a muito, muito tempo. Num casebre muito pobre junto aos portões de entrada da cidade vivia um eremita. Ele era venerado como um asceta santo, muitas pessoas procuravam seus conselhos. Até o rei já tinha ouvido falar dele. Ele quis conhecer esse homem de qualquer maneira. Um dia ele foi até o casebre e perguntou-lhe se não queria mudar-se para o palácio.

- Se o senhor quiser -respondeu o eremita - Posso ir a qualquer lugar.

O rei ficou surpreso, mas não deixou isso transparecer. Ele havia imaginado que o eremita aceitaria seu convite. Um verdadeiro eremita não deveria recusar a oferta? O rei começou a ter dúvidas. Mas como ele já havia feito o convite, levou o homem ao palácio onde mandou que lhe preparassem um belo quarto e uma boa refeição.

E o que fez o eremita? Ele usufruiu do belo quarto e da boa comida. No dia seguinte também, e no seguinte ao seguinte. Esse homem, que dizia ser um asceta, deixou-se tratar muito bem no luxuoso palácio. O rei estava profundamente decepcionado. Depois de uma semana ele falou diretamente ao estranho hóspede:

- Desculpe-me, mas simplesmente não consigo entender como você, um asceta, pode viver em um palácio. Qual a diferença entre você, um homem santo, e eu, um rei?

- Se o senhor quer ver a diferença, então venha comigo para fora da cidade.

Os dois se puseram a caminho. Caminharam por muito tempo sobre campos ensolarados, bosques úmidos e aldeias isoladas. E quanto mais caminhavam, mais impaciente o rei ficava. Quando anoiteceu ele pediu ao eremita insistentemente que finalmente respondesse à sua pergunta.

- Eu lhe direi apenas uma coisa - respondeu ele - Não voltarei mais. Seguirei adiante. O senhor virá comigo?

O rei sacudiu a cabeça.
- Não posso. Não posso abandonar meu reino e meu palácio. Além disso tenho uma família.
- Está vendo a diferença? Eu posso seguir adiante, não deixei nada para trás. Desfrutei das comodidades do palácio. Mas não me apeguei a elas. Por isso eu posso agora seguir adiante.

- Por favor, não faça isso - disse o rei - Volte comigo ao palácio.
- Para mim não faz diferença se volto ao palácio com o senhor ou sigo adiante. Mas se eu voltar, também voltarão suas dúvidas. Por isso, por amor ao senhor, eu seguirei adiante."

Esta história me fez refletir se estamos realmente prontos para largarmos tudo e mesmo assim ainda sermos felizes. No Yoga este conceito é conhecido como Santosha, contentamento e aceitação, ou seja, nossa felicidade e nossa paz independente da situação externa.

Não pensei sobre isso no sentido de sermos um eremita e abandonarmos o mundo, mas no sentido de aceitarmos as mudanças do ciclo da vida e nos conformarmos com as novas situações, que nem sempre vão ao encontro de nossas expectativas.

Mas vejo que muito mais do que nós deixarmos algo, seria o nosso entendimento de deixarmos ir embora algo ou alguém o que não nos pertence. Tenho como ponto de observação a seguinte frase quando estou nestes momentos de aceitar ou não o distanciamento de algo: "O universo é sábio. O que for meu por direito divino venha até o mim, o que não for, que ele leve embora".

Como disse acima, tenho momentos que estou pronto e outros não, por isso ainda faço uso desta frase. Mas vejo isso como algo positivo, pois se consigo ter este discernimento é sinal que estou no caminho certo para trabalhar com meu apego. Pois estou atento a ele e consigo enxergar a hora que ele está presente e a hora que não está. Sendo assim, fica mais fácil lidarmos com algo que conhecemos do que com um fantasma, neste caso o "fantasma do apego".

Outra pergunta que me fiz foi com relação ao desequilibrio que estas mudanças da vida causam em nossa felicidade. Refleti e percebi que usamos várias "muletas" para nos sentirmos felizes: o trabalho, o status social, o relacionamento, os filhos, o carro, o relógio, o celular de última geração dentre várias outras. Por isso, quando a vida nos retira algo que funciona como uma "muleta" nos ficamos infelizes. Qual a muleta que você está usando para manter a sua felicidade?

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